Tinha uma vizinha, quando criança, que se chamava Nancy.

Era uma senhora risonha, baixinha, que alcançava 1m48 quando o dia nascia ensolarado, mineira de Janaúba – cidade ao norte de Montes Claros e muito perto da divisa com a Bahia – que usava um birotinho na nuca a convocar seus cabelos grisalhos para uma reunião íntima. Só que na verdade seu nome não era exatamente Nancy…

Era Pregnancy…

Ela contava a história de seu nome com muita desenvoltura e bom humor. Tanta desenvoltura e bom humor que, apesar de certa verossimilhança, às vezes eu chegava a duvidar de sua autenticidade.

A base da história era a ignorância de sua mãe em relação à língua inglesa: nos anos 20, estava a senhora a folhear uma revista estrangeira que falava sobre a gravidez da atriz Lita Grey, aos 17 anos, e ficou encantada. Tão encantada que achou que o ‘pregnancy’ atochado sob uma foto da moça era o nome que ela pretendia dar à filha que nasceria em breve.

Dito e feito. Alguns poucos anos depois, minha vizinha foi agraciada com o mesmo nome. O fato de Lita Grey e seu marido, Charles Chaplin, terem somente dois filhos homens – o que em tese excluiria da biografia da atriz uma filha chamada Pregnancy – sequer foi considerado. Aliás, provavelmente ela nem tenha ficado sabendo desse mero detalhe.

O fato é que eu me lembro dessa minha vizinha e da história dela sempre que vejo os absurdos que as pessoas cometem quando tentam dar um nome estrangeiro a um filho. Quantas Leide Dai vocês conhecem, por exemplo? Não faz muito tempo, li no crachá do funcionário de uma loja de autopeças que seu nome era Dione. Mas não era, realmente. Na cabeça dele e de seus pais, era Johnny, ao contrário daquele filme com o Selton Melo.

Pois o brasileiro tem mania de dar nome estrangeiro ao filho. Mas, para evitar que os ignorantes que certamente vão conviver com ele errem na pronúncia, escrevem do jeito que se fala em português. Por isso, há muitos Dionatan, Djeine, Braian, Herold, Daiane, Diennifer, Djeikob, Karolaine, Mayke, Deivid, Maicol, Ueslei…

Há uma lei (6.015/73) que dá ao oficial de cartório o direito de se negar a registrar uma criança com um nome que possa constrangê-la no futuro. Isso é subjetivo, porém: os oficiais podem achar – como efetivamente acharam, já que esses nomes estão registrados em cartórios do país – que Bin Laden, Ácido Acetil Etílico, Evódia, Ferônia, Epílogo, Free William, Lacedêmon, Otelino e Gilete não são capazes de provocar constrangimento a seus felizes portadores. Portanto, as crianças estão à mercê de conceitos aleatórios da Humanidade.

A título de ilustração dessa subjetividade, temos o caso de um ex-repórter da Folha que teve negada a certidão de sua filha no cartório de Sorocaba, ao tentar registrá-la como Morena. Dado o inusitado da situação, até a Globo mandou equipe para lá, e a repórter – nossa querida Neide ‘Coca’ Duarte – descobriu que, embora vetasse Morena, o cartório havia certificado sem embargos o nascimento de algumas Pâmelas Suélen, singela homenagem dos pais a duas personagens da série de TV Dallas.

Aí pode?

Marco Antonio Zanfra

2 comentários

  1. eu conheço um VALDILETE GLEAN, deve ter agora uns 30 anos, por aí. Questionei a tia sobre o nome. “É porque o pai se chama Valdilete”, explicou – como se um infeliz na família já não bastasse. E pq o Glean? “Ah, é pra ficar bonito”.

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